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24 de Abril de 2024

STF - Nula Prorrogação de Interceptação Telefônica Superior a 15 dias

há 2 anos

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Decisão Trata-se de Habeas Corpus no qual se alegou a nulidade das decisões judiciais que autorizaram a interceptação da linha telefônica do paciente, assim como das respectivas prorrogações, pelo prazo de 30 (trinta) dias consecutivos. Concedi parcialmente a ordem de Habeas Corpus para ANULAR as interceptações telefônicas do paciente realizadas entre o período do 16º ao 30º dia, decorrentes da decisão proferida nos Autos 2007.60.00.011091-1, da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Campo Grande/MS, referente ao Ofício nº 7.384/2008- DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 27.08.2008, IPL nº 754/07-SR/DPF/MS (Doc. 7, fls. 1-3) e DECLARAR a ilicitude das provas obtidas por esse meio durante o referido lapso temporal, com seu imediato desentranhamento dos autos (Doc. 98). Sucede que a defesa, por meio de Petição (Doc. 102), apresenta manifestação, nos termos seguintes: Ocorre, porém, que diversas outras decisões proferidas nos autos de origem seguiram a mesma lógica acima (de autorizar a quebra do sigilo por 30 dias corridos), sendo também ilegais. Especificamente em relação ao paciente, a Defesa constatou que a primeira decisão que quebrou o sigilo das comunicações oriundas de seu terminal telefônico – nº (31) 9955-6876 (sem referência a seu nome) –, foi prolatada em 18/04/2008, conforme representação de fls. 517/519 e Ofício nº 3236/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de fls. 538, acolhidos às fls. 945/948 (documentos anexos). Aludida decisão, da lavra da MMª Juíza Federal, Dr.ª Raquel Domingues do Amaral Corniglion, também deixou de apontar qualquer motivo excepcional a justificar a inobservância do prazo de 15 (quinze) expressamente previsto no art. 5º da Lei n. º 9.296/96. E de acordo com o Relatório Parcial de Monitoramento de fls. 985/1.005, as conversas telefônicas do paciente foram efetivamente monitoradas pela Polícia Federal durante 30 (trinta) dias consecutivos, do dia 22/04/2008 até o dia 21/05/2008. Dessa forma, mantendo-se a coerência com a decisão proferida por V.Exa., pede-se que também sejam anuladas “as interceptações telefônicas do paciente realizadas entre o período do 16º ao 30º dia, decorrentes da decisão proferida nos Autos 2007.60.00.011091 -1, da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Campo Grande/MS, referente ao Ofício nº Ofício nº 3236/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 16.04.2008, IPL nº 754/07-SR/DPF/MS” (documentos anexos), declarando-se, por conseguinte, a ilicitude das provas obtidas por esse meio durante o referido lapso temporal, com seu imediato desentranhamento dos autos. É o breve relatório. Decido. São relevantes as alegações. Conforme destacado, a alegação central da presente impetração consiste na nulidade das decisões judiciais que autorizaram a interceptação da linha telefônica do paciente, assim como das respectivas prorrogações, pelo prazo de 30 (trinta) dias consecutivos. Após a concessão da ordem neste writ para determinar a anulação das interceptações da linha telefônica do paciente realizadas entre o período do 16º ao 30º dia, referente ao Ofício nº 7.384/2008- DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 27/8/2008, IPL nº 754/07-SR/DPF/MS, informa a defesa que a primeira decisão que quebrou o sigilo das comunicações oriundas do terminal telefônico do paciente foi prolatada em 18/4/2008 (Doc. 5, fls. 16-19), conforme representação formulada pela autoridade policial por meio do Ofício nº 3236/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS (Doc. 5, fls. 10-12). Ocorre que o referido ofício foi juntado sem o respectivo anexo, no qual constava o número do terminal telefônico do paciente, que somente veio aos autos por meio da presente petição (Doc. 103). Nesse contexto, considerando que a primeira decisão que autorizou a interceptação da linha telefônica do paciente pelo prazo de 30 (trinta) dias consecutivos foi proferida em 18/4/2008 (Doc. 103, fls. 5-8), necessário estender os efeitos da concessão parcial da ordem de Habeas Corpus para também reconhecer a sua ilegalidade e determinar a sua parcial anulação. Diante o exposto, DEFIRO o pedido formulado pela defesa para ANULAR as interceptações telefônicas do paciente realizadas entre o período do 16º ao 30º dia, decorrentes da decisão proferida nos Autos 2007.60.00.011091-1, da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Campo Grande/MS, referente ao Ofício nº 3236/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS (Doc. 5, fls. 10-12, e Doc. 103), e DECLARAR a ilicitude das provas obtidas por esse meio durante o referido lapso temporal, com seu imediato desentranhamento dos autos. Comunique-se, com urgência. Publique-se. Brasília, 26 de maio de 2021. Ministro Alexandre de Moraes Relator Documento assinado digitalmente

(STF - HC: 183534 MS 0089347-57.2020.1.00.0000, Relator: ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 26/05/2021, Data de Publicação: 27/05/2021)



Decisão Trata-se de Habeas Corpus impetrado contra acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Agravo Regimental no RHC 106.364/MS, submetido à relatoria do Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA. Consta dos autos, em síntese, que, no curso de Inquérito Policial, cujo objeto de investigação é apurar o desvio de conduta de alguns servidores da Receita Federal lotados na Inspetoria de Corumbá/MS, os quais são suspeitos de promover e/ou facilitar a prática do contrabando e descaminho, inclusive mediante possível recebimento de propina, paga pelas empresas e despachantes com maior proximidade perante tais servidores, a Polícia Federal representou pela quebra de sigilo de dados telefônicos e pela interceptação telefônica do paciente e de outros investigados (Doc. 5, fls. 20-27). Após manifestação favorável do Ministério Público (Doc. 5, fls. 28-31), as medidas foram autorizadas pelo Juízo de origem, determinando às operadoras que procedam, pelo período de 15 (quinze) dias, prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias, a contar da data da implementação técnica, à QUEBRA DO SIGILO TELEFÔNICO, de modo que as conversas realizadas sejam gravadas, a ORDEM INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, a interceptação dos IMEIs vinculados aos terminais telefônicos (tudo para que as interceptações não se interrompam em razão d eventual troca de chips nos aparelhos (Doc. 5, fl. 32 e Doc. 6, fls. 1-7). Findo esse prazo, houve prorrogação da diligência, por mais 15 (quinze) dias (Doc. 6, fls. 22-25). A Polícia Federal, então, novamente representou pela prorrogação da quebra do sigilo telefônico e interceptação telefônica do paciente e de outros investigados, o que foi deferido pelo magistrado de primeiro grau, em decisão assim fundamentada (Doc. 7, fls. 2-3): O Doutor Delegado de Polícia Federal representa pela prorrogação e quebra do sigilo telefônico das linhas seguintes: 1) PRORROGAÇÃO: 31 9955 6876 e 67 8111 8409: INTERCEPTAÇÃO: 31 9393 3233, 67 3213 2609 e 67 9645 4945 constantes do oficio n 7.384/2008- DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 27.08.2008. Esclarece que a policia federal vem investigando uma organização com integrantes também da Receita Federal, formada para a prática de exportação fictícia, facilitação de descaminho e corrupção ativa e passiva, principalmente na região da fronteira com a Bolívia. Relaciona a autoridade os nomes dos investigados e também as ações de cada um, devendo as investigações continuar mediante o monitoramento das conversas telefônicas entre os membros dessa quadrilha. Essa medida é indispensável para a cabal apuração dos fatos. O Ministério Público Federal. em seu laborioso parecer, é pelo acolhimento da representação. Passo a decidir. As diligências aqui solicitadas devem ser autorizadas. Nos autos do inquérito policial, procedentes da vara federal de Corumbá -MS, existem fortes indícios da participação dos nominados nestes autos, em fatos com aparência delituosa. Tratar-se-ia de uma organização com raízes na Receita Federal, o que, com certeza, atuando na área de comércio exterior. causa uma sangria nos cofres públicos federais, além de desequilibrar a política de importação e exportação do Governo Federal. Nenhuma pessoa. física ou jurídica, pode invocar a garantia constitucional do sigilo bancário, telefônico ou fiscal para se esconder da ação fiscal ou da justiça penal. A garantia constitucional desaparece diante do interesse público. que é prevalente. Assim sendo, deve ser quebrado o sigilo telefônico, nos termos da representação da ilustre autoridade policial federal. […] Deste modo, o interesse público na investigação dos fatos impõe o acolhimento da manifestação ministerial, que ratifica a representação da autoridade. Diante do exposto e por mais que dos autos consta, decreto a quebra do sigilo telefônico, a nível nacional, das novas linhas e a prorrogação das linhas também relacionadas no ofício 7.384/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, 27.08.2008, por 30 (trinta) dias. O presente procedimento fica revestido do sigilo previsto para o caso. Oficie-se às empresas. Seguiram-se mais duas representações com vistas à prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica, que, após manifestação favorável do Ministério Público Federal, foram deferidas pelo Juízo de origem pelo prazo de 15 dias, prorrogáveis por mais 15 dias (Docs. 7, fls. 17-22; Doc. 9, fl. 2-7). No curso das investigações da denominada “Operação Volcano”, o paciente foi denunciado “nas ações penais nº 0010681-71.2008.4.03.6000, pela prática, em tese, dos delitos capitulados nos artigos 333 e 334, ambos do Código Penal e nº 0001062.90.2017.4.03.6004, pela prática, em tese, do delito previsto no artigo 333, § 1º, do Código Penal, ambas em trâmite na 1ª Vara de Corumbá/MS, ambas em fase de instrução” (Doc. 93, fl. 61). Alegando nulidade da decisão que autorizou a quebra do sigilo telefônico e as interceptações telefônicas realizadas nos autos da investigação e as sucessivas prorrogações, a defesa impetrou Habeas Corpus no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que denegou a ordem, conforme ementa (Doc. 93, fl. 39): PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÕES HABEAS CORPUS TELEFÔNICAS. LEI Nº 9.296/1996. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO. DECISÕES FUNDAMENTADAS. DURAÇÃO, RENOVAÇÃO E PRORROGAÇÃO RESPALDADAS EM PARÂMETROS DE RAZOABILIDADE E INTERESSE SOCIAL NA PERSECUÇÃO PENAL. NULIDADE E FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO CONFIGURADAS. ORDEM DENEGADA. - O art. , inciso X, da Constituição Federal, garante o dever de sigilo ao dispor serem "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação." De seu turno, o inciso XII deste artigo traz uma ressalva, quando houver uma investigação criminal ou durante a instrução processual penal, e em havendo ordem judicial, ao dispor sobre a interceptação das comunicações telefônicas/telemáticas: "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal." Trata-se de reserva legal de modo que a autorização judicial para a intervenção condiciona-se à existência de uma precedente investigação criminal ou para a instrução processual penal. - A Lei nº 9.296, de 24.07.1996, veio regulamentar as hipóteses do cabimento da interceptação de comunicações telefônicas (captação realizada por terceira pessoa sem o conhecimento daqueles contra os quais estão sendo coletadas as provas), de qualquer natureza, e a interceptação de comunicações em sistema de informática ou telemática, realizada por terceiros. - A interceptação telefônica, como visto, é a captação feita por outrem sem que haja o conhecimento pelas pessoas em face das quais estão sendo colhidas as provas. O procedimento previsto nesta Lei é um importante meio de prova em investigação criminal, contudo, a fim de impedir intromissão na esfera privada, a sua aplicação deve ser aferida a partir da invocação dos princípios da intimidade e da privacidade, da proporcionalidade, da legalidade, da presunção de inocência, do princípio do nemo tenetur se detegere - princípio da não autoincriminação, da razoável duração do processo, da inadmissibilidade de provas ilícitas e do princípio da instrumentalidade constitucional do processo penal. - Exatamente porque o crime organizado tem conseguido agir com elevado poder de detecção de brechas no sistema repressivo estatal, o Estado deve agir com rapidez e efetividade conjugando os direitos dos investigados com os princípios da integridade estatal (art. , caput, da Constituição Federal), da promoção do bem de todos (art. , inciso IV, da Constituição Federal) e da segurança pública (art. da Constituição Federal) e adotando ações de inteligência para frear esta modalidade criminosa. - A Constituição Federal determina no inciso IX do artigo 93 a fundamentação das decisões judiciais ("todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação"). O artigo 5º apresenta a mesma diretriz da norma constitucional, mormente por referir-se à medida restritiva de privacidade e diante da proteção constitucional à intimidade do indivíduo. Não se exige que a decisão seja pormenorizada, com motivação exaustiva e minudente, porquanto se cuida de procedimento cautelar em que o juiz realiza juízo sumário, analisando os fatos a ele apresentados na representação policial. A decisão deve conter elementos suficientes a demonstrar a pertinência do pedido, as razões empregadas na motivação judicial e o suporte legal da medida, de modo a ser possível eventual impugnação pelas partes. - A demonstração do "fumus boni juris" e do "periculum in mora" deve restar evidenciada na decisão, já que "a importância da fundamentação ultrapassa a literalidade da lei, pois reflete a liberdade, um dos bens mais sagrados de que o homem pode usufruir, principalmente em vista dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, da presunção de inocência e da dignidade da pessoa humana" (STJ, HC 248.263/SP - 2012/0142646-1, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 5ª Turma, v.u., DJe 02.10.2012). - A fundamentação das decisões judiciais objetiva, ademais, demonstrar a imprescindibilidade do meio de prova pretendido pela autoridade policial. Não se trata de uma relativização do princípio da presunção de inocência, porquanto não está sendo realizado um juízo sobre a culpa do investigado, mas o juiz estará na ocasião pautado no exame de indícios concretos de que a pessoa possa estar cometendo crime punível com pena de reclusão, diante da existência de indícios de autoria e materialidade delitivas. - Tem sido permitido que a decisão judicial de renovação faça menção ao pedido de decretação da interceptação telefônica realizado pela autoridade policial ou pelo Ministério Público, o qual passa a integrar a fundamentação da decisão (fundamentação "per relationem"), uma vez que propicia às partes conhecer os fundamentos encampados pela decisão judicial, sendo reconhecida como válida pelos Tribunais Superiores (TRF3, Habeas Corpus n.º 2007.03.00.103554-3/SP, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal Convocado Hélio Nogueira, v.u., DJU de 29.04.2008, p. 380). Este também tem sido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "é assente nesta Corte e no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que não há que se cogitar em nulidade da sentença por ausência de fundamentação ou ofensa ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, se o juiz, ao fundamentar sua decisão, reporta-se à sentença anteriormente prolatada, ou mesmo ao parecer do Ministério Público, na denominada fundamentação 'per relationem'" (AgRg no AgRg no AREsp n.º 17.227/ES, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, Sexta Turma, v.u., DJe de 08.02.2012.). Ainda em igual sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal ao ser permitida a renovação de autorização de interceptação telefônica a despeito de não terem sido inseridos novos motivos: "este Tribunal firmou o entendimento de que 'as decisões que autorizam a prorrogação de interceptação telefônica sem acrescentar novos motivos evidenciam que essa prorrogação foi autorizada com base na mesma fundamentação exposta na primeira decisão que deferiu o monitoramento' (HC 92.020/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa). O Plenário desta Corte já decidiu que 'é possível a prorrogação do prazo de autorização para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando o fato é complexo, a exigir investigação diferenciada e contínua. Não configuração de desrespeito ao art. , caput, da Lei 9.296/1996"(HC 83.515/RS, Rel. Min. Nelson Jobim). - Em 22.07.2008, houve a representação pela quebra de sigilo telefônico-Ofício nº 6.010/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS, anteriormente tombado sob nº 154/06-DPF/CRA/MS), com vistas à apuração do “desvio de conduta de alguns servidores da Receita Federal lotados na Inspetoria de Corumbá/MS, suspeitos de promover e/ou facilitar a prática de contrabando e descaminho, inclusive mediante possível recebimento de propina, paga pelas empresas e despachantes com maior proximidade perante tais servidores”, pelo período de 15 (quinze) dias prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias, incluindo dentre as linhas telefônicas pertinentes à investigação, a do paciente, ALCIBÍADES NUNES MIRANDA. - O Ministério Público Federal manifestou-se favoravelmente pela continuidade do monitoramento dos terminais telefônicos e dos e-mails dos investigados. Por conseguinte, a MM. Juíza da 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS, Raquel Domingues do Amaral Corniglion, acolheu a representação policial. Ato contínuo, seguiram-se mais quatro representações com vistas à prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica incluindo o paciente. - A duração do monitoramento telefônico e a renovação das autorizações judiciais devem ser avaliadas segundo os princípios da razoabilidade e o interesse social na persecução criminal. Nessa perspectiva, cumpre observar que a decisão que deferiu a quebra do sigilo telefônico e a interceptação telefônica do paciente está datada de 25.07.2008, sendo o último deferimento datado de 31.10.2008. - Verifica-se que as interceptações telefônicas, mostraram-in casu, se indispensáveis e foram autorizadas diante da extensão, intensidade e complexidade das condutas delitivas investigadas, que apontavam para uma suposta organização criminosa. - De acordo com as informações prestadas pela autoridade impetrada, o acervo probatório coligido nos autos do IPL nº 754/2007-SR/DPF/MS subsidiaram a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal. Nessa diretriz, imperativo reconhecer que o monitoramento telefônico não configurou constrangimento ilegal. - A representação policial pela quebra de sigilo telefônico e as decisões judiciais que autorizaram a interceptação telefônica encontraram-se devidamente fundamentadas, não estando maculada pelas ilegalidades sustentadas. - O Juízo de primeiro grau, após a anuência do Ministério Público Federal, autorizou o monitoramento das ligações telefônicas por entender que os elementos colhidos demonstravam indícios gravosos de prática criminosa e apontavam para a imprescindibilidade do deferimento da medida excepcional. - Tanto a primeira autorização, quanto a primeira prorrogação de interceptação telefônica incluindo o paciente, foram deferidas pelo período de 15 (quinze) dias prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias; a segunda prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica foram deferidas pelo período de 30 dias, e a terceira e quarta prorrogações, pelo prazo de 15 dias. - É bem verdade que a interceptação, de fato, não deverá exceder 15 (quinze) dias, podendo ser renovada por igual período, sem restrição quanto à quantidade de prorrogações que podem se efetivar, desde que demonstrada a necessidade de tais diligências para as investigações. - Não cabe ao Magistrado inovar em matéria legislativa, pois tal munus é privativo do Congresso Nacional. Se a lei determina 15 (quinze) dias, este é o prazo legal a ser observado. - Note-se, porém, que os fatos trazidos aos autos revelaram-se extremamente complexos, na medida em que se buscou investigar possíveis atos de pagamento de propina a funcionários da Receita Federal com vistas à liberação de cargas sem a devida fiscalização e à facilitação de tramitações ilícitas de mercadorias que transitavam pela AGESA. - A convicção do magistrado, pois, sobre o envolvimento dos investigados na atividade criminosa, somado à complexidade da organização, podem justificar, neste caso excepcional, a fixação de um prazo de escuta superior ao patamar legal. O que se destaca, aqui, é a necessidade de fundamentação adequada e pertinente. Disso o magistrado não pode abrir mão. Desta maneira, ainda que a regra geral deva ser o cumprimento literal da norma, excepcionalmente, justifica-se tal decisão. Precedentes jurisprudenciais do C. STF, C. STJ, E.TRF3 e E. TRF4. - Ordem denegada. Contra esse acórdão, foi interposto Recurso em Habeas Corpus dirigido ao Superior Tribunal de Justiça, ao qual o Ministro Relator negou seguimento (Doc. 93, fls. 108-122), em decisão confirmada pelo colegiado ao negar provimento ao subsequente Agravo Regimental. Eis a ementa do julgado (Doc. 95): AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRAZO SUPERIOR A QUINZE DIAS. EXCEPCIONALIDADE INVESTIGAÇÃO COMPLEXA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Esta Corte Superior de Justiça tem se posicionado no sentido de que, a despeito de contrariar a literalidade do art. da Lei n. 9.296/1996, a limitação do prazo para a realização de interceptações telefônicas não constitui óbice ao deferimento da medida excepcional por período superior a 15 dias, desde que haja circunstanciada justificação, com específica indicação da indispensabilidade de tal prazo (HC 421.914/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 19/3/2019, DJe 26/3/2019). 2. No caso destes autos, a complexidade da organização e o número de pessoas envolvidas justificam, de maneira adequada e suficiente, a necessidade de autorização da medida por prazo superior ao indicado pela lei. 3. A autorização da medida foi precedida de atos de investigação que descortinaram organização criminosa complexa, envolvendo o pagamento de propina a servidores da Receita Federal com vistas à liberação de cargas sem a devida fiscalização e à facilitação de tramitações ilícitas de mercadorias, de modo que está adequadamente justificada a necessidade da medida invasiva, não havendo que se falar em violação do art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. 4. Agravo regimental improvido. Nesta ação, a defesa sustenta, em síntese, a nulidade das decisões judiciais que autorizaram a interceptação da linha telefônica do paciente, assim como das respectivas prorrogações. Argumenta que: (a) Não se desconhece que a jurisprudência eventualmente admita a prorrogação interceptações por períodos mais dilatados, inclusive superiores a 30 (trinta) dias. Entretanto, é fato que a Lei n. 9.296/96 exige (i) que cada período de interceptação seja limitado a 15 (quinze) dias e (ii) que cada prorrogação decorra de decisões judiciais específicas e devidamente fundamentadas (STF – HC n. 129.646/SP), o que não é o caso dos autos, definitivamente; (b) o d. Delegado de Polícia Federal representou pelo afastamento do sigilo de suas comunicações e o eminente magistrado, acatando o vazio requerimento, determinou a inclusão de seus terminais (fls. 945/948), evidenciando, o infeliz automatismo com que eram processados e deferidos os pedidos de prorrogação naquele feito; e (c) tanto a decisão que decretou a interceptação telefônica do ora paciente quanto suas sucessivas renovações carecem de fundamentação hábil a justificá-las, não passando de meras repetições de dizeres genéricos, pelos quais não se infere a comprovação da ‘indispensabilidade do meio de prova’ para autorizar renovações sucessivas e para muito além do prazo legalmente permitido. Requerem os impetrantes, assim, a concessão da ordem, a fim de que seja reconhecida a ilicitude de todos os elementos de prova trazidos aos autos posteriormente ao afastamento do sigilo telefônico do paciente. É o relatório. Decido. Nos termos do inciso XII do artigo da Constituição Federal, a interceptação telefônica dependerá de ordem judicial (cláusula de reserva jurisdicional), que, de acordo com o art. da Lei nº 9.296/1996, deverá ser expedida pelo juiz competente para a ação principal, em decisão devidamente fundamentada que demonstre sua conveniência e indispensabilidade (STF, Pleno, Inq. 2.424, Rel. Min. CEZAR PELUSO, decisão: 26/11/2008; STF, 1ª T., HC 94.028 Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, decisão: 22/4/2009; STF, HC 103.418/PE, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Informativo STF nº 648; STF, 2ª T., HC 96.056/PE Rel. Min. GILMAR MENDES, decisão: 28/6/2011. No Superior Tribunal de Justiça, conferir: STJ, 5ª T., HC 104.005/RJ, Rel. Min. JORGE MUSSI, decisão: 8/11/2011). Não há dúvidas, portanto, de que o afastamento da inviolabilidade constitucional em relação às comunicações telefônicas exige a presença da imprescindibilidade desse meio de prova, pois a citada lei vedou a realização de interceptação de comunicações telefônicas quando não houver indícios razoáveis da autoria ou da participação em infração penal ou a prova puder ser feita por outros meios disponíveis (STF, 2ª T. HC 105.527/DF Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/5/11; STF, 1ªT. HC 94.028 Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, decisão: 22/4/2009; STF, Pleno, Inq. 2.424, Rel. Min. CEZAR PELUSO, decisão: 26/11/2008). No presente caso, o inconformismo está centrado na alegação de nulidade das interceptações telefônicas realizadas no curso das investigações da denominada "Operação Vulcano". Inicialmente, tem-se que não assiste razão à defesa quando alega que tanto a decisão que decretou a interceptação telefônica do ora paciente quanto suas sucessivas renovações carecem de fundamentação hábil a justificá-las. A propósito, analisou o Superior Tribunal de Justiça (Doc. 95): Ao que se tem dos autos, o Juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, autorizou a quebra dos sigilos bancários e telefônicos, além de permitir ação controlada, com o objetivo de desvendar o funcionamento de organização criminosa voltada para a prática de exportação fictícia, facilitação de descaminho, corrupção ativa e passiva. Os crimes, segundo apurado, eram cometidos na região da fronteira com a Bolívia. A decisão que deferiu a interceptação telefônica se baseou na existência de fortes indícios da participação dos nominados nestes autos, em fatos com aparência delituosa. Tratar-se-ia de uma organização com raízes na Receita Federal, o que, com certeza, atuando na área de comércio exterior, causa uma sangria nos cofres públicos federais, além de desequilibrar a política de importação e exportação do Governo Federal (e-STJ, fl. 65). As informações contidas nos autos também permitem aferir o envolvimento de grande número de pessoas e a complexidade dos fatos apurados, como bem resumiu o acórdão ora impugnado (e-STJ, fls. 8413/8417): Inicialmente a autoridade policial realizou sua primeira representação pela quebra de sigilo fiscal, financeiro e telefônico em 25.09.2007, nos autos do IPL n.º 0154/2006-DPF/CRA/MS (que originou posteriormente a ação penal principal, processo n.º 2006.60.04.000779-6), cujo objetivo era apurar possível ocorrência do delito previsto no artigo inciso II, da Lei nº 8.137/1990 c.c. artigo 288 do Código Penal, tendo em vista notícia de que os fiscais da Receita Federal em Corumbá (Paulo Borges, Gustavo Freire, Joelson Santana e Carlos Rocha Lelis - funcionários da Receita que trabalhavam na AGESA), o Técnico do Tesouro Nacional, Euclides, e o funcionário da AGESA de nome Jorge participariam de um esquema de cobrança de mercadorias que transitariam pela AGESA, além de facilitarem o descaminho (ID3552353-pág. 1). No curso das investigações preliminares realizadas pela Polícia Federal de Corumbá/MS, detectaram-se fortes indícios de enriquecimento indevido, com acréscimos de patrimônio incompatíveis com os prováveis rendimentos auferidos por alguns funcionários da Receita Federal. (...) Em 22.07.2008, houve a representação pela quebra de sigilo telefônico-Ofício nº 6.010/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS, anteriormente tombado sob nº 154/06-DPF/CRA/MS), com vistas à apuração do “desvio de conduta de alguns servidores da Receita Federal lotados na Inspetoria de Corumbá/MS, suspeitos de promover e/ou facilitar a prática de contrabando e descaminho, inclusive mediante possível recebimento de propina, paga pelas empresas e despachantes com maior proximidade perante tais servidores”, pelo período de 15 (quinze) dias prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias, incluindo dentre as linhas telefônicas pertinentes à investigação, a do paciente, ALCIBÍADES NUNES MIRANDA (ID3552366). O Ministério Público Federal manifestou-se favoravelmente pela continuidade do monitoramento dos terminais telefônicos e dos e-mails dos investigados, ressaltando que o trabalho de inteligência investigativa, no bojo da qual inseridas as interceptações telefônicas, telemáticas e de dados de informática, impõe monitoramento permanente e atento dos alvos, às vezes, por longo período, pela própria dinâmica de atuação das organizações criminosas. Interromper as investigações, neste momento, implicaria grave risco de perda de informações relevantes para a instrução de eventual processo penal. Não bastasse isso, o relatório do período anterior e as mídias que armazenam as informações dão conta do intenso contato entre os alvos, justificando, neste ponto, a necessidade de deferimento da representação (ID 3552366). (...) A duração do monitoramento telefônico e a renovação das autorizações judiciais devem ser avaliadas segundo os princípios da razoabilidade e o interesse social na persecução criminal. Nessa perspectiva, cumpre observar que a decisão que deferiu a quebra do sigilo telefônico e a interceptação telefônica do paciente está datada de 25.07.2008 (ID3552366), sendo o último deferimento datado de 31.10.2008 (ID3552379). Verifica-se que as interceptações telefônicas, mostraram-se in casu, indispensáveis e foram autorizadas diante da extensão, intensidade e complexidade das condutas delitivas investigadas, que apontavam para uma suposta organização criminosa. A Constituição de 1988 assegura a inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, permitindo, excepcionalmente, a flexibilização dessa garantia nas hipóteses de investigação criminal ou para a instrução processual penal, nos termos da legislação pertinente. Desse modo, a interceptação telefônica é um procedimento permitido por lei, desde que seja determinado por decisão judiciária fundamentada, de ofício ou a requerimento da autoridade policial, na investigação criminal, ou do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal, bem como que haja indícios razoáveis de autoria ou participação delitiva, a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e o fato investigado constituir infração penal punida de forma mais severa que a detenção. As questões levantadas pela defesa abordam dois aspectos relevantes relacionados à legalidade das interceptações telefônicas. O primeiro deles diz respeito à presença de fundamentação suficiente para a adoção da medida. O segundo se refere ao prazo da medida e ao acerto das decisões que autorizaram e prorrogaram as interceptações por períodos de trinta dias. As duas abordagens se interrelacionam. Não se admite a interceptação telefônica com amparo em decisão desprovida de suficiente fundamentação, até porque a própria Constituição exige que o juiz sempre exponha os fundamentos que sustentam as suas decisões (art. 93, inciso IX, da Constituição Federal). De outra parte, repudiam-se as escutas autorizadas por tempo indeterminado ou que se prolonguem por período além do estritamente necessário. […] Feitas essas considerações, verifica-se que, no caso concreto, as interceptações telefônicas foram autorizadas no bojo de investigação cujo objetivo era apurar o delito previsto no art. , inciso II, da Lei n. 8.137/90 (exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente). No curso das investigações, foram encontrados indícios da prática de outros delitos e de outros envolvidos, justificando a necessidade da medida na forma como autorizada pelo magistrado de primeiro grau, conforme se verifica pela leitura do trecho a seguir (e-STJ, fls. 8421/8422): In casu, tanto a primeira autorização, quanto a primeira prorrogação de interceptação telefônica em relação ao paciente, foram deferidas pelo período de 15 (quinze) dias prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias (ID3552366, ID3552368); a segunda prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica foram deferidas pelo período de 30 dias - ID3552371, e a terceira e quarta prorrogações, pelo prazo de 15 dias - ID3552373 e ID3552379. Não cabe ao Magistrado inovar em matéria legislativa, pois tal é munus privativo do Congresso Nacional. Se a lei determina 15 (quinze) dias, este é o prazo legal a ser observado. Note-se, porém, que os fatos trazidos aos autos revelaram-se extremamente complexos, na medida em que se buscou investigar possíveis atos de pagamento de propina a funcionários da Receita Federal com vistas à liberação de cargas sem a devida fiscalização e à facilitação de tramitações ilícitas de mercadorias que transitavam pela AGESA. A convicção do magistrado, pois, sobre o envolvimento dos investigados na atividade criminosa, somado à complexidade da organização, podem justificar, neste caso excepcional, a fixação de um prazo de escuta superior ao patamar legal, apesar de não ser recomendável. O que se destaca, aqui, é a necessidade de fundamentação adequada e pertinente. Disso o magistrado não poderia abrir mão. Verifica-se, portanto, que a complexidade da organização o grande número de envolvidos justificam a decisão de autorizar a prorrogação das interceptações por prazo superior ao de 15 (quinze) dias indicado na lei. Também não se pode falar em deficiência na fundamentação das decisões que autorizaram a medida e nas que chancelaram as prorrogações. O fato de a medida ter sido precedida de investigação que constatou indícios de crimes envolvendo grande número de investigados desautoriza o acolhimento do pleito defensivo relativo à carência de fundamentação das decisões que autorizaram e prorrogaram a medida já que, ainda que sucintamente ou fazendo referência à decisão proferida anteriormente, todas apresentam fundamentação e não padecem de vício de ilegalidade apto a ensejar sua nulidade. Como visto, o Juízo de origem autorizou o início das interceptações em análise, após manifestação do Ministério Público Federal, com vistas à apuração do ‘desvio de conduta de alguns servidores da Receita Federal lotados na Inspetoria de Corumbá/MS, suspeitos de promover e/ou facilitar a prática de contrabando e descaminho, inclusive mediante possível recebimento de propina, paga pelas empresas e despachantes com maior proximidade perante tais servidores’, (...) incluindo dentre as linhas telefônicas pertinentes à investigação, a do paciente, ALCIBÍADES NUNES MIRANDA (ID3552366). Por seu turno, a Corte Regional assentou que a representação policial pela quebra de sigilo telefônico e as decisões judiciais que autorizaram a interceptação telefônica encontraram-se devidamente fundamentadas, sobretudo porque os elementos colhidos demonstravam indícios gravosos de prática criminosa e apontavam para a imprescindibilidade do deferimento da medida excepcional. Em face de tal quadro, não se verifica o apontado vício. Segundo assentaram as instâncias antecedentes, a decisão que autorizou a realização das interceptações telefônicas apresenta justificativa idônea acerca da necessidade da medida e está fundamentada nos atualizados e detalhados pedidos formulados, que explicaram claramente a imprescindibilidade da diligência. Em outras palavras, houve demonstração mínima e razoável de que a medida era imprescindível para elucidação dos fatos, especialmente se levada em conta a extensão, intensidade e complexidade das condutas criminosas investigadas. É importante registrar que a referência às razões inicialmente legitimadoras da interceptação e ao contexto fático delineado pela parte requerente não torna a decisão deficiente, pois – é bom repetir – foi indicada e pormenorizada a imprescindibilidade da medida em cada um dos requerimentos (HC 125.792-AgR, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 16/2/2016). Não se verifica, portanto, o apontado vício de fundamentação. Por outro lado, quanto ao pedido relacionado ao limite de dias entre cada umas das prorrogações da interceptação telefônica, assiste parcial razão à defesa. No presente caso, pelo que se depreende dos autos, houve cinco decisões de interceptação de conversas telefônicas dirigidas contra o paciente – portanto, uma inicial e quatro prorrogações – , cuja cronologia fora assim descrita pela Corte Regional: Relativamente ao paciente, seguiram-se mais quatro representações com vistas à prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica, a saber: - Ofício nº 6.518/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 06.08.2008 (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS)-; após a manifestação favorável do Ministério Público Federal, a MM. Juíza da 3ª Vara Federal de Campo Grande/MS, Raquel Domingues do Amaral Corniglion, deferiu a quebra de sigilo telefônico pelo prazo de 15 dias, prorrogáveis por mais 15 dias - ID 3552368; - Ofício nº 7.384/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 27.08.2008 (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS) - o MM. Juiz da 3ª Vara Criminal Federal de Campo Grande/MS, Odilon de Oliveira, após a manifestação favorável do Ministério Público Federal, decretou a quebra de sigilo telefônico por 30 dias - ID3552371; - Ofício nº 8.617/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 07.10.2008 (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS) - o MM. Juiz da 3ª Vara Criminal Federal de Campo Grande/MS, após a manifestação favorável do Ministério Público Federal, decretou a quebra de sigilo telefônico por 15 dias - ID3552373; - Ofício nº 9.358/2008 - DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 31.10.2008 (IPL nº 754/07-SR/DPF/MS) - o MM. Juiz da 3ª Vara Criminal Federal de Campo Grande/MS, Odilon de Oliveira, após a manifestação favorável do Ministério Público Federal, decretou a quebra de sigilo telefônico por 15 dias -ID3552379. [...] Nessa perspectiva, cumpre observar que a decisão que deferiu a quebra do sigilo telefônico e a interceptação telefônica do paciente está datada de 25.07.2008 (ID3552366), sendo o último deferimento datado de 31.10.2008 (ID3552379). [...] In casu, tanto a primeira autorização, quanto a primeira prorrogação de interceptação telefônica em relação ao paciente, foram deferidas pelo período de 15 (quinze) dias prorrogáveis por mais 15 (quinze) dias (ID3552366, ID 3552368); a segunda prorrogação de quebra de sigilo telefônico e interceptação telefônica foram deferidas pelo período de 30 dias - ID3552371, e a terceira e quarta prorrogações, pelo prazo de 15 dias - ID3552373 e ID3552379. A respeito da matéria, dispõe o art. , XII, da Constituição Federal: XII - e inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; A legislação de regência (Lei 9.9296, de 24 de julho de 1996) estabelece que: Art. 5º: A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. As informações que acompanharam os pedidos de interceptação e as subsequentes renovações se revestiram de demonstração mínima e razoável de que a medida era imprescindível para elucidação dos fatos, especialmente se levada em conta a extensão, intensidade e complexidade das condutas criminosas investigadas. Ressalte-se, porém, que, além da imprescindibilidade desse meio de prova, o afastamento da inviolabilidade constitucional em relação às comunicações telefônicas exige estrita observância aos requisitos previstos na Lei 9.296, de 24/7/1996, editada para regulamentar o inciso XII, parte final do art. , da Constituição Federal. O art. da Lei nº 9.296 determina que a interceptação telefônica não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. Não é possível limitar-se o prazo de 15 (quinze) dias à uma única renovação, pois esse lapso temporal de 30 (trinta) dias, certamente, não possibilitaria o desmantelamento de grandes organizações criminosas estruturadas. Em grandes investigações – como a retratada nestes autos -, assim como em operações de tráfico de drogas, de tráfico de armas, de tráfico de seres humanos, de corrupção, são necessários meses ou até anos de apuração, tamanha a complexidade. Assim, não seria razoável que a Constituição, expressamente, no inciso XI do art. , se referisse a esse meio específico de prova, interceptação telefônica, se fosse para a Lei torná-la absolutamente inútil. O que se exige exatamente é a fundamentação comprovando a indispensabilidade e a eficácia desse meio de prova, demonstrando que alguns crimes dificilmente seriam efetivamente apurados e que algumas quadrilhas dificilmente seriam desbaratadas se não houvesse a possibilidade desse meio de prova. Obviamente que, por constituir-se em restrição à intimidade e vida privada, esse meio de prova não pode ser banalizado. Exatamente por isso, a cada quinze dias deve existir nova renovação, mediante nova decisão judicial devidamente fundamentada. Dessa maneira, há circunstâncias em que a indispensabilidade desse meio de prova possibilitará sucessivas renovações, cada qual por período não superior a 15 (quinze) dias, desde que, a cada nova renovação, o magistrado analise detalhadamente a presença dos requisitos constitucionais e legais, bem como a razoabilidade da manutenção dessa medida devastadora da intimidade e privacidade, sob pena de inversão dos valores constitucionais (HC 130.596 AgR, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 30/8/2018; HC 145.569 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 28/9/2017; RHC 117.495 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 19/6/2017; RHC 132.111 AgR, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 13/6/2017; HC 139.370, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 25/4/2018; HC 83515, Rel. Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, DJ de 4/3/2005; INQ 2424, Rel. Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, DJe de 26/11/2008; INQ 2725, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe de 30/9/2015; HC 133148, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 15/12/2017; RHC 153869 AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJe de 14/5/2020). Excepcionalmente, essa SUPREMA CORTE admitiu o deferimento excepcional pelo período de 30 dias consecutivos das interceptações telefônicas, consideradas as circunstâncias da causa constantes, detalhadamente, na motivação da decisão do magistrado (cf. ARE 1260103 ED-segundos-AgR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe de 2/10/2020; HC 106129, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, DJe de 26/3/2012; HC 161412 AgR, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJ 30/11/2018; RHC 88371, Rel. Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJ de 2/2/2007). Essa excepcionalidade, entretanto, não incide na espécie, pois, para além da inexistência de suporte legal, o Juízo de primeira instância nem sequer apresentou fundamentação destacada, “com específica indicação da indispensabilidade de tal prazo”. Na espécie, a interceptação telefônica foi deferida, inicialmente, por 15 (quinze) dias, prorrogados por mais 15 (quinze) (Doc. 5, fl. 32 e Doc. 6, fls. 1-7). Ao término desse prazo, a autoridade policial representou pela renovação do prazo e, após aquiescência do Ministério Público, a continuidade da diligência foi autorizada pelo magistrado de primeiro grau, por 30 (trinta) dias consecutivos (Doc. 7, fls. 2-3); sem qualquer motivação que indicasse a excepcionalidade da medida. Em regra, constitucional e legalmente, portanto, há possibilidade de sucessivas renovações, desde que, – salvo graves excepcionalidades –, para cada período de 15 (quinze) dias o magistrado competente justifique de maneira fundamentada sua decisão pela manutenção dessa medida constritiva (HC 113.812, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 1º/6/2018; HC 137.820, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 12/6/2018). Assim, prorrogada a diligência, de uma vez só, por 30 (trinta) dias corridos, sem qualquer fundamentação a indicar a excepcionalidade da medida extrema, tem-se que a continuidade da diligência após o 15º dia, sem autorização judicial específica, torna ilícita a prova obtida a partir dela, por violação ao art. , XII, da Constituição Federal. É importante ressaltar, no entanto, que o reconhecimento da nulidade de parte da interceptação telefônica por falta de autorização judicial específica não há de macular todo o conjunto probatório produzido de forma legal. Todavia, as captações telefônicas realizadas a partir do 16º dia e as respectivas transcrições devem ser consideradas ilícitas e, por consequência, desentranhadas dos autos. Diante do exposto, com fundamento no art. 192, caput, do Regimento Interno do STF, CONCEDO PARCIALMENTE a ordem de Habeas Corpus para ANULAR as interceptações telefônicas do paciente realizadas entre o período do 16º ao 30º dia, decorrentes da decisão proferida nos Autos 2007.60.00.011091-1, da 3ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de Campo Grande/MS, referente ao Ofício nº 7.384/2008-DELEFAZ/SR/DPF/MS, de 27.08.2008, IPL nº 754/07-SR/DPF/MS (Doc. 7, fls. 1-3) e DECLARAR a ilicitude das provas obtidas por esse meio durante o referido lapso temporal, com seu imediato desentranhamento dos autos. Comunique-se, com urgência. Publique-se. Brasília, 14 de dezembro de 2020. Ministro Alexandre de Moraes Relator Documento assinado digitalmente

(STF - HC: 183534 MS 0089347-57.2020.1.00.0000, Relator: ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 14/12/2020, Data de Publicação: 15/12/2020)


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